domingo, 16 de maio de 2010

Ele não sabe o que é melhor pra Luzia.

Luzia me disse: “Ele não sabe o que é melhor pra mim” e aí eu quis saber da história toda.
Eu sabia que Luzia me contava a história mexendo as mãos como se fosse a Doutora Senhora F.S. Coisa e Tal, mas que ela era uma coitada que um dia ouviu falar de amor e quis saber o que era. (Chegou ao ponto de se trancar no quarto pra sentir sozinha o peito pesando, logo ela que já havia vivido coisa que até santo desconfia.).
Luzia me contou que quando ela se sentia forte o bastante, ele a fazia mudar de ideia. E como ela não gostava de ser contrariada, nessa parte da conversa, falava dele com a boca cheia de todos os chingamentos que eu demorei anos pra decorar.
Quando eu a perguntei o que mais a incomodava, respondeu:
“O que me incomoda é que quando eu era bebê, eu só precisava chorar para comer;
Quando eu ia à praça, era só apertar a mão da minha mãe para ir ao pula-pula;
Quando eu queria um brinco de pena, eu dizia que gostava de coisa hippie e todo mundo entendia. Quando eu levantava a sobrancelha esquerda mais pro canto, amiga minha sabia que o mocinho Senhor Coisa e Tal estava atravessando a rua. Quando eu estralava os dedos, quando eu apertava os olhos, quando eu fazia comentários superficiais, quando eu fazia perguntas aparentemente inúteis... um ou outro sempre conseguia flagrar alguma intenção. E o que realmente me incomoda é que o desgraçado não entende nenhum sinal meu! Não dá pra notar ou eu tenho mesmo que ligar e dizer: ‘Ei, dá pra você vir aqui resolver o meu problema?’”
Luzia pediu licença, e foi tomar uma asprina.
Aspirina não cura Luzia, aspirina não cura.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Nem um curioso, nem Newton

Juro que não é cansaço, mas é que quando o filme passa por mais de duas vezes, a primeira cena não é mais tão impactante.
Juro que não é tristeza, até uma notícia do jornal do meio-dia te deixa com o coração entre tábuas.
Juro que não é desespero, nem quero atropelar os bois, mas é que quando se ganha um ovo de páscoa, não dá pra abri-lo só no natal.
Juro que não é raiva, mas se você já emprestou o bonequinho do Power Rangers pro seu vizinho, e ele voltou sem uma perna, você não iria emprestá-lo tão fácil pro mesmo assassino-mirim.
Juro que não é auto-decepção, até quando te deixaram no banco de reserva na oitava série, você teve que sentar se sentindo incapaz.
Também não deve ser saudade, eu não ando tendo muito tempo pra chorar pelo copo de pinga quebrado.
E eu nem vou ficar pagando uma de entendida...
O fato é que as vezes me dá umas oscilações psicológicas (eu não me atreveria a dizer emocionais) mas diferente desses físicos e fofoqueiros que sempre inventam coisas e raramente explicam, eu não sei bem que sensações são essas mas sei muito bem o porquê delas estarem aqui.

domingo, 2 de maio de 2010

O amuleto que eu fiz

Eu fiz um amuleto, desses de guardar em cordinha de pescoço e que te faz lembrar presentinhos de gente que baba quando pensa em outra gente. Quando eu tenho raiva do que esse amuleto me lembra, dá vontade de jogá-lo na parede branca do meu quarto, mas eu o guardo no bolso como quem não vê a hora de pendurá-lo novamente. Quando eu o tiro do bolso, eu o seguro bem forte pro cheiro nunca mais escapar e é nessa hora que eu mais gosto do amuleto.
Se não fosse feito por mim, ele me seria entregue da seguinte forma: alguém o seguraria com as duas mãos e me diria “Toma; pra você”, só isso.
Mas ninguém me deu, eu o fiz e até nome ele tem. Quando eu quero esquecer o amuleto, eu o escondo em uma gaveta de guardar papel. Só que do mesmo jeito que alguém quando esconde 50 reais ou chiclete no guarda-roupa nunca esquece de verdade que guardou, eu-criador não consigo esquecer radicalmente meu amuleto-criatura. Eu deito pra dormir, coloco a mão no meu pescoço e penso “O amuleto não existe mais” mas quando eu fecho o olho eu não evito de mudar o raciocínio: “Ele tá ali, só esperando o ‘algo ou alguém’ falar que ele fica melhor perto do meu queixo”. E essa é a segunda hora que eu mais gosto do amuleto, eu me imagino abrindo a gaveta e ouvindo ele me pedir pra nunca mais guardá-lo.