quarta-feira, 31 de março de 2010

O consultório

Cheguei à conclusão que esses consultórios nada mais são do que uma escala maior de espaço e tempo de um elevador. Pois tudo o que há são conversas de tempo e de campeonato brasileiro.

Hoje eu fui a um desses elevadores gigantes e a minha segunda conclusão foi que se eu visitasse aquele lugar uma vez por semana, em um mês eu escreveria um livro de contos.

Teve aposentada estranha que só saía de casa quando chovia pra chegar com a barra da calça encharcada, teve vovô surdo que não entendia que era pra levantar da cadeira, teve vovó que sentou do meu lado e quase me perguntou a cor do meu esmalte e o que era aquele negócio que eu carregava nas mãos que tinha tecla e acendia às vezes, teve criança birrenta que respondia gente grande já sabendo que um dia seria uma, teve perua que descobria a vida dos outros em dois minutos, teve gay, teve conhecida que não parou de olhar meu short curto (até então comportado) e teve encontro de gente podre e rica que fingia ter saudade de um outro rico só pra perguntar no fim se ele tinha comprado aquela mansão no final da rua.

Se não bastasse, eu ainda li todas as “Época” e “Exame” até eu me sentir nerd o suficiente e aí parar de ler. Ainda tive tempo pra pensar no que a secretária pensava ao falar com o carinha da tatuagem e como ela seria um monstro ao chegar em casa, já que lá devia ser o único lugar que ela não precisaria dar bom dia com cara de quem nunca sentiu dor de barriga na vida.

Tirando a parte que o doutorzinho atrasou a minha consulta em uma hora, o tempo no consultório me fez sentir mais leve... Eu tive tempo de olhar as pessoas e não somente passar por elas.

Falando em pessoas, eu não poderia deixar de comentar daquela que me fez elevar o sorriso pra direita. Foi uma das conversas mais espontâneas daquela sala fria:

- Lá na sua floricultura tem uma orquídea estupenda?

- Tem sim, dá uma passadinha lá...

- É pra minha mulher...

- Ah sim

- Ela não merece não, mas hoje eu lembrei de como ela gosta das orquídeas; ela chega cansada em casa e ela vai gostar de abrir a porta e ver uma.

sexta-feira, 26 de março de 2010

- Porque você insistiu em uma história tão sem nexo?

Essa é uma história de um rapaz que conhece uma moça, mas, você tem que saber de antemão que essa não é uma história de amor.

Os dois não foram feitos um para o outro e daqui uns meses eles não dirão que já conheceram a metade da laranja, eles só se olharam um dia e gostaram do que viram.

Ele a quis como quis tantas outras. Ela não.

Ela sempre aceitou os de focinho e gosto dentro de um padrão pré-determinado (mas que menina burra e previsível!), até que um dia ela decidiu dar ouvidos a alguma coisa que não fosse alguma pessoa.

Essa coisa de paixão nunca lhe agradou muito, aliás, minto, nunca lhe foi muito lucrativo. Por auto-imposição ou não, ela nem se apaixonou, o que não quer dizer que ela não tenha começado.

Mas como toda história, que não é de amor, acaba, essa também.

Ela só não quis descartar, que dirá esquecer. Sabe-se lá por que.



‘- Porque você insistiu em uma história tão sem nexo?

- Porque ele nunca me foi confiável, correspondeu às minhas expectativas (e isso não quer dizer que foram boas), e porque sempre ouve uma coisa nisso tudo que me dizia: ‘Larga de bobeira, que mal há? Abrace esse menino como se fosse seu mundo..como se aqueles olhos fossem mar: não deixa de ser um mistério e talvez por isso seja tão paralisante’. Eu só quis ouvir isso até o meu coração querer ficar surdo. E porque quando ele me olhava ao mesmo tempo em que bagunçava o cabelo, eu achava que talvez valesse a pena me decepcionar por aquele menino cor de jambo.

quarta-feira, 24 de março de 2010

E talvez eu possa mesmo escolher

Eu abri a janela hoje cedo pra ver se algo lá fora falasse pro meu coração ficar mais lento. É porque eu tinha algo pra fugir de tudo, mas agora, eu to precisando fugir principalmente desse algo.

Eu vejo gente feia, gente sem dente, gente que ainda nem sabe que é gente e gente que esqueceu como é isso andando por aí e eu penso que talvez não seja só eu que queira tanta coisa.

Eu queria escolher o padrinho do meu filho caçula, a amiga do chá das cinco; o ‘cumpade’ que leva cerveja pra jogar truco na quinta à noite; a vizinha que sempre faz festa pros sobrinhos e me leva brigadeiro no outro dia; o outro vizinho que vai lavar o carro sem camisa; aquela pra me ligar às 3h da manhã pra falar que viu na tv um ‘anel-minha-cara’ mas que ele custa 5x mais do que eu posso pagar; um vovô que passe todo dia em frente a minha casa e me chame de Patrícia misteriosamente. Eu queria escolher alguém que não precisasse dizer ‘eu te amo’ sempre pra parecer apaixonado, mas que me falasse que eu fiquei horrorosa só pra não confessar que meu vestido vermelho tá curto demais.

Já achei que eu tivesse encontrado muita gente dessas, já conheci gente e sorri por pensar “esse vai ser o vizinho” ou “essa vai ser a perua que vai me roubar os batons”, já foram embora muitos, mas eu ainda tenho muitas janelas pra abrir até eu conhecer todos os outros.

Eu não sigo regras pra as coisas acontecerem, eu prefiro que os dias vão me mostrando como que tudo isso acontece; mas é claro que quando eu tenho um tempo pra pensar bobeira, eu sempre penso em quantos sorrisos diferentes vai ter o carinha que vai deixar um chocolate do lado do travesseiro com um papel cortado à mão escrito: “o que te engorda, te mata mas você ta precisando engordar uns dois quilinhos ;)”.

Eu to precisando pensar nessas coisas sem pé e nem cabeça, costuma funcionar quando eu preciso fugir.

domingo, 21 de março de 2010

Achei ridículo

Continuo achando.

Nesse jogo todo, meu amor, quem ganha mesmo não é quem leva o troféu pra colocar na estante. Eu ganhei muito mais entendendo como o jogo funciona.

Eu torço pra você ter um dia pra chorar por entender como a vida é. Deve ser lamentável ser levada sem saber o motivo e nem por quem. Eu só não sei até quando você vai se contentar em ser coadjuvante e fazer parte de uma maré.

Eu não preciso de contato e muito menos de consideração, ainda bem. A idéia de (certas) convivências me dá ânsia de vômito.

E ah, já que você quer tanto,

que você se auto-destrua!

sexta-feira, 19 de março de 2010

Menos uma escrivaninha

Você me faz querer quebrar os móveis e os dentes.

E eu não suporto a idéia de me ver tão sua.

Mas a cada dia que passa, eu te entrego cada pedacinho de pele minha sem você saber.

Eu quero teus ombros, olhos e nuca (porque sacanagem faz parte).

Quero momentos muito mais nossos do que de manequins, mesmo porque, é neles que eu te vejo tão meu, e é bom que você também quebre alguns móveis.

terça-feira, 16 de março de 2010

Ser mistério e achar as coisas menos complexas

Eu não sou a mesma todos os dias, bendito seja.
Desconsolada é pra viúva. Depressiva é pra desocupada. Solitária é pra anti-social. Reflexiva é pra santa arrependida. Eu apenas ‘invento’ histórias, já faz tempo.
Tem dias que eu acordo pensando no dia; no sábado, na noite.
Eu precisava de madrugadas das quais eu risse quando acordar, sem precisar me sentir ridícula por isso.
Queria poder chorar sempre sem esses nós no peito. Se não fosse possível, que isso acontecesse às vezes.
Eu tenho um sério problema, eu queria ser mais racional. Eu queria conformar com certos baques, sem precisar ver o dia passar mais lento.
Eu não quero trilhar o caminho mais fácil, não mesmo. E caso eu vá pelo pior, que eu tenha alguém comigo pra não achar que cada esquina é o fim.
Eu cansei de pedir olhos nos olhos, então, que seja o que Deus quiser. Mas que Ele descubra o que o meu peito pede quando ele parecer estourar. Eu só preciso confiar nisso.
Eu quero ser mistério e achar as coisas menos complexas. É mais fácil assim.
Afinal, a partir de qual 365 que algo aqui vai mudar?

sábado, 13 de março de 2010

Meu menino,

Eu te juro que eu te quero tanto as vezes que me dá vontade de ir onde você estiver pra ver se os seus ossos estralam com um abraço meu.

Eu te juro que eu te odeio tanto as vezes que me dá vontade de esquecer o seu nome e trocar por ‘desgraçado’, pra ficar repetindo enquanto meus dedos da mão se fecham.

Eu não tenho o controle do tempo, eu até que queria, não sei até onde vão esses segundos que eu tenho que parar e respirar forte pra descarregar tanta coisa,

então,

meu menino,

deixe dessa manha toda.

Tenho preguiça

Tô sem paciência pra esses peitos empinados e andar de quem já errou muito na vida mas adora ser coitada.

Tô sem paciência pra nariz metido a superior e que, na verdade, cheira esterco.

Tô sem paciência pra gente colecionando anos mas que insiste naquelas coisas da minha quinta série.

Tô sem paciência pra convivência forçada,

‘Não sei fazer jogo social. Até saberia, mas não me interessa. ’

Não me interessa saber da sua vida, eu tenho a minha, e ela deveria não te interessar também. Se eu quebrar o braço ou quebrar a cara, quem vai sentir a dor sou eu. E eu sei como lidar com isso, já quebrei outras vezes.

Tem muita coisa acontecendo fora dessas quatro paredes; tem gente que resolve os problemas de umbigo e tem gente que me dá preguiça. São esses que enchem meu sapato de pedra.

Se você quer comprar um carro, pular de um prédio ou queimar a língua de tanto mal-dizer, que faça! Só não me inclua nas suas futilidades, tô sem paciência.

Eu tenho dó, mas eu até que entendo, a grama do vizinho é sempre mais verdinha, não é mesmo?

Eu e minhas peças

Porque quando o meu ‘eu’ despedaça eu não sei em qual parte eu me apego.
Mesmo porque eu sou um amontoado das pessoas que vivem cá, e quando uma delas se vai, eu sofro como se fossem dois amontoados.
Eu não sou inteira, eu sou fragmento.
E como tudo que há é jogo...
Como num dominó, se uma peça desmorona, acaba a brincadeira.